sábado, 16 de agosto de 2014

NA AJUDA, PERTO DO ANGELUS

Igreja da Ajuda; água forte de Diógenes Rebouças: "Ajuda se chama e Sé de Palha foi esta casa /  De oração e olvido..."


                                     A Pedro Moacir Maia

                                   Vellos e vellas, mentras monean

                                   Silbam as salves y os padrenuestros
                                                                       Rosalia de Castro


Vagando em horários que induzem à meditação,
No centro da ilustre urbe de caminhos imperfeitos,
Pelas cinco que um agosto regem de cinza e frio,
Ando sobre remotas pedras de um templo ultrajado,
Sítio por onde transitaram pés de cinco séculos.
Ajuda se chama e Sé de Palha foi esta casa
De oração e olvido, que ambição voraz amputou:
Cá sombrias paredes com pinturas descascadas,
Santos em seus nichos, a dialogar com sossegados
Mármores, sob arcadas que aludem a inquisições
E a penas sancionadas pela autoridade do latim.
Um careca no órgão, um cantor de blusa listrada,
Como se de pedra fossem, calmos entoam cânticos.
Luzes mortiças sob imagens sacras em panóplias,
Cenas do evangelho toscas espalham-se no teto,
Escorrem por janelas ancestrais de falso gótico
E o púlpito de madeira lavrada onde ressoam
Veementes sermões, gestos falazes, sagacidades.
Entre jogos de luz e sombra, entre volumes, mesclas
De formas neoclássicas e pungente barroquismo,
Frias flores em altares de círios apagados;
Homens e mulheres, as mãos em prece, a ruminar
Silentes verdades que adubam a razão dos pobres,
Em semblantes de conformismo e vaga transgressão.
Bailam no ar transidos coros de infância e lembranças
De garotas (onde estarão elas?) de seios duros,
Fugazmente apalpados na hora de tanger os sinos,
Aquela depois do Angelus, nos maios de novena,
Enquanto padre Luiz Sanjuan a cabeça meneia
E cochila entre as gastas alfaias da sacristia.   

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