De alma em fuga, a duas pernas da aurora.(.. ) Ou felino tropel vencendo selva. Henri Rousseau (1844-1910): O SONHO |
(...) por exemplo: “A noite está estrelada,
e tiritam, azuis, os
astros ao longe”.
Pablo
Neruda
De longe brasa, mas de perto gelo;
Rumor de água ao passar, ouro o cabelo.
De mármore, estatura de colosso,
A beleza do corpo; o rosto moço
Lima e esculpe espírito e inteligência.
No olhar esquivo, um vórtice, uma ciência.
De alma em fuga, as duas pernas da aurora
Rompem com passo rijo o afã do agora:
Cenário de ânsias e melancolias,
Ruído que é de augúrio, fatos e dias
- o seu instante, na caverna lúcida.
Sol de galáxia me transfere luz, se da
Esguia taça de âmbar salpicada
De ardências me confunde e impõe-se fada
Arisca: rastro ágil de corça em relva,
Ou felino tropel rompendo selva.
Sobrevindo o fragor, estruge e planta
No imo do coração lodo de pântano.
Silencioso terror repele e ensombra
O que fora esperança, agora sombra.
Em rota de naufrágio, apalpo o escuro
No mar de seus olhos, onde procuro,
Perscruto acenos, véspera do abismo.
Venço o risco, respiro atalhos, cismo.
Logo estancas, como água de remanso.
Longe dos cactos, eu também me canso.
Franqueada a noite para céu risonho,
Escancaro as janelas de meu sonho:
Qual colibri que sorve a flor num beijo,
Desfolho-te, mulher, enquanto arquejo.
SSA, 13/01/2007
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