quarta-feira, 20 de agosto de 2014

WASHINGTON, D. C.

Washington, no crepúsculo: "E a capital. É o Capitólio. Tudo / cheira a destino que se cumpre". 


            Huyó lo que era firme, y solamente
           lo fugitivo permanece y dura.
                                               Quevedo


Refúgio da geometria, a cidade
se propõe Acrópole em linhas retas.
O espaço se elege em claridade.
O céu urbano, atento olho
de águia ou réptil, espreita-me.
De tão claro nada me surpreende.

É a capital. É o Capitólio. Tudo
cheira a destino que se cumpre.
Virá de Bizâncio o luxo de existir?
Será de Roma o mapa luzidio,
ali onde o manto de César cobre
amplos jardins e praças verdejantes?
Brutus passeia. Mecenas e Tibério
descansam em seus palácios. Daqui
estou quase enxergando Gaio
nas escadarias da Suprema Corte.

O silêncio (verde piscina) brune
a certeza de que nada ameaça ares e muros.
Espalha-se em lufadas. Nenhum grito,
Labirinto de calma participante,
a vida ao sol navega convincente.
Lincoln, pedra gelada, de seu templo,
vigia paralelas nos espelhos.

De partida, meus olhos forasteiros
inquirem: o que permanecerá?
A geometria, o  bom senso como busca?
Washington: tributo a veteranos da Guerra da Coreia
A habilidade de trabalhar com signos?
O cimento das ideias, o instinto do futuro?
Ou apenas, visto da autoestrada, sobre lodo,
lento, viscoso, polindo armas e medalhas,
o Potomac, nostálgico, como o Tibre
da antiga Roma coberta de brasões?

Miro a esplanada;  o vento adere
à imensidão do espaço organizado,
no crepúsculo que banha Watergate.


(Washington, EUA, ago. 1978)

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