segunda-feira, 11 de novembro de 2024

O TREM GRAPIÚNA, conto de Ricardo Brugni Cruz

    Inauguração da Estação da Estrada de Ferro de Itabuna (1911)
 


O TREM GRAPIÚNA

(Para Florisvaldo Mattos)


 

Ricardo Brugni-Cruz

 

 

“Ainda vejo passar o maquinista,

o guarda-freios, lépido, o foguista,

a me acender a lenha da memória.

Elas contam um tanto desta história,

a que junta cacau com coronéis,

da passagem custando dois mil

Réis.”

 

                                                                     O Trem Grapiúna

Soneto de Florisvaldo Mattos

 

O poeta apontou para os trilhos carcomidos de salitre e ferrugem. Estavam há muito soterrados no solo ressecado, mal encobertos pela vegetação seca e rasteira. Adiante, ele disse: ruínas, foi o que sobrou da velha estação. Os trilhos jaziam como ossadas tortuosas, vestígios de outra época, ossadas antigas encravadas na memória do solo. Antigamente serviam à estação ferroviária de Ilhéus. Agora o que se vê são pedaços de ferro abandonados pelo descaso e incompetência — disse ele — vagas testemunhas de caminhos da velha maria fumaça, outrora levando em seu bojo viajantes e mercadores; apontam para o passado parecem gritar: aqui existiu a estação de trens de Ilhéus... O poeta continua: o trem grapiúna passava por Itabuna, Pirangy, Água Preta, Mutuns, Rio do Braço, Serra Verde, Santa Cruz, além de servir a outras cidades que desapareceram ou ganharam nomes novos, graças ao velho trem grapiúna... Margeava o Rio de Contas, na ida e de volta. Fazia parte da paisagem junto à mata densa, protetora dos cacauais. O povo fazia a festa, comemorava chegadas e partidas; velhas estações apodreceram, foram transformadas em catacumbas.

Lembrou-me ele dos vagões destinados a passageiros com seus bancos inteiros e desconfortáveis, dos vagões de carga destinados ao transporte de toneladas de sacas de cacau para serem despachadas do porto ilheense para o mundo, enriquecendo os coronéis fazendeiros, compradores e donos da armazenagem do cacau. Os despejados ou fugitivos da seca do nordeste, homens e mulheres de outras e distantes regiões. A eles era exigida a dura tarefa da colheita, a quebra dos frutos, retirada das sementes polpudas para secagem e finalmente o ensacamento dos grãos.   

            

Eu, Bruno, Dantas, Dori e Guga — além desses havia também uma garota, Irene, um pouco mais velha que Dori, dizia ter 16 anos enquanto nós outros estávamos na faixa dos 13, 14 e 15 anos. Sabíamos que a permanência do trem estacionado na estação, estava condenada a desaparecer. O trem partia daqui, da estação de Ilhéus, rumo às cidades vizinhas à Ilhéus e Itabuna, tendo como proteção densos trechos de Mata Atlântica, e de passagem era bafejado pelo ar salitroso vindo do Atlântico.

                 Cada vez menos, o trem ia e voltava para novamente repetir o ciclo de ir e vir, carregado com sacas de cacau empilhados nos vagões de carga. De algum tempo, seus vagões transitavam quase vazios; insistentes, passageiros carregavam suas bagagens: malas, caixotes, engradados nos quais agitavam-se galinhas, porcos, preás. Eventualmente alguma caça defumada viajava envolvida num saco: teiú, paca, veado, porco-do-mato... Durante a viagem era agradável ver-se a paisagem tranquila dos tamarineiros, cajueiros, cajazeiras, coroados por aves diversas a sombrear o cacaual. Saudavam a seu modo a passagem do trem, a soltar colunas de fumaça branca que do alto das copas das árvores talvez fosse possível, para os pássaros, enxergarem-na como se fossem nuvens sopradas por entre as engrenagens do trem, para logo dispersarem-se e se desfazerem no ar, como algodão-doce na boca de uma criança.    

              Foi Irene quem, certa manhã, nos contou que iam mesmo acabar com a estrada de ferro. Nenhuma novidade, já estávamos acostumados a assistir a estação ser desmontada. O trem teria o mesmo destino. Mais dia, menos dia, acabariam com ele também. Aquela garota era filha da cafetina e fazendeira conhecida como Dona Candu. A mãe possuía uma pensão que servia aos viajantes de passagem pela região, como a alguns moradores de Ilhéus. Acolhia viajantes das cidades próximas e também acolhia os que vinham de cidades mais distantes. Além desses, havia os gringos que perambulavam com seus baús de mercadorias. Viviam a bater de porta em porta na busca por compradores. Entre eles, alguns eram representantes de firmas de perfumaria, artigos para barbearias e salões de beleza, lojas e armazéns, além de diversos outros artigos considerados de luxo, para o uso diário de homens e mulheres. Mercavam ferragens de diversas utilidades para fazendas, e também muitos tipos armas de fogo de diversos calibres e munições, para atender a todo tipo de caçadores.  A pensão de Dona Candu, além do mais, servia de hospedagem para jovens prostitutas desembarcadas na região, que atendiam aos fazendeiros e comerciantes endinheirados, onde eles as supunham escondidas (bem como seus encontros), das fofocas das cidades. Não faltavam mulheres jovens para satisfazer os apetites sexuais daquela gente.

              De maneira que Irene, além de ser, para nós, importante mensageira do que se passava na pensão de Dona Candu, era ao mesmo tempo uma espécie de instrutora de atividades sexuais para nossa turminha, já conhecida como “a turminha da estação” ou, “moleques da estação”.  Não éramos nada bem vistos pelas famílias que moravam nas cercanias da velha estação. Tampouco pelas famílias ditas de bons costumes de Ilhéus. Não dávamos oportunidade a outros garotos das vizinhanças que tentavam, vez em quando, invadir aquele espaço que havíamos conquistado. Éramos bons de porrada para garantir a posse do “nosso território”, exceto quando nos interessava a entrada deles para uma partida de futebol, mas nem sempre, com permissão e tudo, as coisas não terminavam bem. Babas costumam gerar ressentimentos, não podia ser diferente devido a nossa permanente ocupação do território, discutíamos, brigávamos, então entrávamos em guerra contra nossos “inimigos.” Nas batalhas usávamos, fartamente, bolotas de mamona como munição facilmente colhidas nas moitas da planta mãe, encontradas por todos os lados, dentro e fora do terreno da estação. Aquelas bolotas esféricas e peludas eram disparadas por bodoques, nossas armas. Bodoques eram a única que usávamos, de ambos lados. Irene era a melhor atiradora, sua mira era perfeita, não perdia uma bala, “a arma” sempre apontada para a coxa do inimigo, ali doía mais dizia ela. Essa era a minha Irene.               

                      Nossa ou minha (minha Irene), ela nunca foi, mas, apesar da vigilância e dos ciúmes esboçados por Dori, ela mesma se excedia em atenções para comigo. Ele também manifestava seus ciúmes para com ela, mas esbarrava na altivez de uma mulher dona de si. Sabíamos por ela própria que o pai abusara dela vezes sem conta, desde pequena. Contou-me, a mim e a Dori, que tinha uma irmã, Dora. Garota ainda, sofrera dos mesmos abusos. Como se não bastasse Dora era oferecida aos hóspedes da pensão em troca de dinheiro. Um belo dia Dora fugiu de casa em companhia de um viajante vendedor de produtos odontológicos, sendo por ele abandonada em Jequié, onde a jovem se entregou à prostituição. Daí nunca mais souberam dela. O pai foi assassinado em uma feira de curtume por um cigano de quem era devedor de algum dinheiro. A mãe encarregou-se de Irene, mas fingindo-se cega para o que se passava, continuou estimulando a filha a vender favores sexuais para os hóspedes que considerasse ilustres. Houve algumas tentativas frouxas da mãe para que ela frequentasse a escola, mas as tentativas fracassaram por ser a garota quem todos sabiam quem era (e quem era sua mãe). Com pouca escolaridade e por esforço próprio, Irene aprendeu a ler e escrever com alguma dificuldade, como demonstrava. O assunto (escandaloso) da pensão era de domínio público, não havia como mãe e filha se livrarem da má fama, sobretudo cultivada por senhoras da sociedade local, em geral religiosas e puritanas, que se consideravam guardiãs “da moral, e bons costumes”, dos filhos das famílias grapiúnas.

               — Na pensão — disse-nos Irene —, os homens não cansam de falar que os políticos vão mesmo acabar com a estrada de ferro. Não vai demorar, só esperam o asfalto da estrada de Itabuna para Ilhéus ficar pronto; o cacau passará a ser transportado por caminhões, e ônibus vão servir ao povo. Quem for rico terá de viajar dirigindo o próprio carro.

              Essa conversa não era mais segredo para ninguém. Só não se entendia por que a necessidade de serem usados caminhões em vez de se continuar com a estrada de ferro... O trem é o transporte mais limpo e eficiente do mundo, além de ser o mais barato, como todo mundo estava cansado de saber. Pelo Recôncavo Baiano transitam até hoje sobre trilhos, na mesma pista usada por automóveis, ônibus e caminhões. Cruzam-se diariamente nas pontes, ruas e praças, e cada um segue seu destino e pronto. O trem grapiúna há anos faz parte da paisagem, indo para além da região cacaueira. Sua passagem sempre despertou desejos e fantasias, como se pretendesse lembrar a todos os que existiam e contemplavam sua passagem, que todos eram igualmente passageiros de uma mesma viagem.

               Ninguém falava, embora todos soubessem que os ricos odiavam a massa trabalhadora, pobres coitados que para os endinheirados nenhuma diferença faria se andassem de carroça, a pé, ou fossem extintos. Melhor que desaparecessem com a velha estrada de ferro e seus vagões inúteis (assim julgavam), pois nem para transportar cacau serviam mais. Aquela gente grapiúna se sentiria mais confortável se modernos meios de transportes de passageiros viessem para a região e fossem acessíveis para servir a todos. Navios, sim, por que não?... Os velhos e antigos navios da Costeira precisavam ser aposentados. O mar era para todos, um novo porto estava para ser inaugurado. Os ricos daquela época pensavam em carros importados, carrões americanos de preferência, luxuosos, reluzentes, a bordo deles poderiam desfilar pelas novas estradas asfaltadas, pelas ruas e praças das cidades do interior (mas não para Ilhéus, já com ares de Capital!). Então, tivemos que agir, não dava para esperar mais, aquele era o momento:

                   Manhãzinha após escondermos entre arbustos, moitas e folhagens da mata adjacente as nossas bicicletas, vimos que nossa amiga Irene já nos aguardava, ansiosa. Estava acompanhada por Guga, garoto que de vez em quando dava as caras e era muito metido. Não gostávamos dele por ser riquinho e espalhafatoso, metido a engraçado, sempre de olhos e ouvidos abertos para tudo que fazíamos e dizíamos. Irene andava irritada, nervosa: “Minha mãe me obriga ficar com o atual dela, um gringo espanhol gorducho e fedendo a alho, ele vive me bolinando, passando a mão nos meus peitos... na minha bunda, dá vontade de vomitar, de matá-lo... Hora dessas boto fogo naquela pensão... e desapareço, como fez minha irmã!”, ameaçava.

                 Dori e Irene buscavam o matagal em frente do que ainda era o terreno da estação. Escondiam-se de olhares intrusos. Agiam como um casal e não devíamos perturbá-los. Fazíamos silêncio, vários olhares pregados na mata, eram momentos angustiosos para mim que ficava a imaginá-los em cenas de sexo. Passava o resto da manhã irritado, brigava por qualquer motivo que me tirasse do sério. Ninguém poia falar alto, dar risadas ou o que fosse... Quando os dois afinal retornavam ao nosso convívio, tudo voltava ao normal, eu disfarçava o sentimento que me corroía por dentro. Da última vez minha irritação foi ainda maior porque o administrador da “estação” estudava cercar a área, o que significava acabar com nossos encontros, jogos e brincadeiras, interditar “nosso espaço”, em definitivo. Já circulava a notícia, inclusive nos jornais de Itabuna e no de Ilhéus que o trem Grapiúna estava com os dias contados, logo faria sua última viagem. Como ambos jornais, tanto o de Ilhéus como o de Itabuna, noticiavam. Foi a conta. Para nós era o bastante! Então brotou a ideia de vingança. Não demorou muito, sabíamos como e o que deveríamos fazer. No dia seguinte da partida do trem (seria aquela a última?), nós o faríamos descarrilar, a velha maria fumaça não passaria da ponte da Barra de Itaípe! Com nossas bicicletas carregamos mais que o necessário para a descarrilharmos: pedras, galhos de árvores, pedaços de ferro velho, palmeiras dos coqueiros endurecidas pelas marés, curtidas e endurecidas pelo sol, e o que mais encontrássemos com cara de ser capaz de descarrilhar um trem!

                  Uns dois dias depois da nossa decisão, só aguardamos o anoitecer após a partida do trem e todo material que recolhemos espalhamos estrategicamente sobre os trilhos, antes da ponte da Barra de Itaípe. Assim fizemos. Que se fodessem, trem e maquinista, foguista e passageiros e quem mais nele tivesse embarcado naquela última viagem. O trem voltaria à estação pelo meio da manhã do dia seguinte. Então saberíamos.

                 Tudo feito como de acordo, contritos, voltamos, cada um para sua casa; juramos por todos os santos e bradamos: piripicado, rebocado e amaldiçoado para sempre quem abrisse a boca e nos delatasse. Como poderia haver vítimas fatais, exigimos segredo entre nós. Aquele era um pacto sagrado, portanto: piripicado o filho (ou filha) da puta que vazasse o que passou a ser nosso segredo, estava vaticinado nas entrelinhas do nosso dito que algo de muito ruim aconteceria para quem quebrasse o juramento...  Aquele aviso era para ser levado a sério!

                No fundo não esperávamos, eu particularmente não esperava, nem desejava sequer a possibilidade de que um de nós fosse apontado como suspeito pela tragédia. Seria o mesmo que denunciar a todos nós. E se alguém resolvesse dar com a língua nos dentes? O medo, a culpa, tomaram conta de mim: e se alguém morresse? E se fossemos denunciados? Torcia para que não houvesse passageiros naquela viagem... E se houvesse? Pequenos ferimentos era possível acontecer: gente ferida... era possível, mas mortes?... morrer alguém, o maquinista?... Era demais...  E o desgosto que eu causaria aos meus pais? Haveria investigação e seríamos descobertos. Não consegui dormir, passei a noite de olhos abertos, o corpo tenso voltado para a parede... Acordado, tive pesadelos e pensamentos com desastres de trens... Somente comentei com Dori, antes de ir para casa, toda minha angústia. Acho que nem o impressionei. Ele estava muito seguro e consciente de que “todos agimos como homens valentes. Era o que deveria e ser feito e fizemos!” “E Irene?... E Guga? Acha que vão segurar a língua?...” Perguntei. Dori deu de ombros.

                  Manhãzinha, pulei da cama e parti com minha bicicleta. Passei a madrugada de olhos abertos e orelhas em . Dava para ouvir do meu quarto o apitar do trem. Ouvi   com nitidez a frenagem súbita, tinidos de metais se entrechocando... Gritos abafados de pedidos de socorro... Desesperei com o reverberar de sons angustiantes dentro do meu peito, sons que subiam para explodir dentro da minha cabeça... Segui à toda, pedalando, pedalando, o coração disparado, ofegava... Entorpecido, enfim, o vi intacto, estava lá, estacionado, todos os vagões inteiros. Cinco ou seis. Nuvens brancas de fumaça eram expiradas de sob suas rodas a intervalos, chiavam como suspiros de alívio que vieram se confundir com os meus. Vozerio indistinto partiam da cabine da locomotiva, tudo parecia controlado, homens conversavam, não pareciam angustiados. O maquinista pressentira o perigo, conseguiu frear a locomotiva diante do amontoado de galhos, ferros, pedras; destroçados, havia restos das palhas de coqueiro endurecidas...

                 — Só pode ser obra desses índios pataxó, só pode...

                   De onde estava ouvi um dos homens dizer e todos concordaram que sim. Era o que deveria ser feito, providências contra eles. Imaginei-os armados com carabinas e revólveres prontos para darem cabo da última nação pataxó.  Afastei-me da estação e percebi que daquela manhã em diante seria proibida nossa presença e encontros naquele espaço aberto da estação — foi como tudo aconteceu.

                 Na manhã seguinte toda a área passou a ser muito vigiada e logo foi cercada com estacas de concreto perpassadas por arame farpado. Talvez os últimos viajantes da nossa maria-fumaça tenham se prestado a ajudar na remoção do que havíamos espalhado por entre e sobre os trilhos. Por via das dúvidas, deixamos de comparecer para nossos encontros no espaçoso terreno da estação; logo todo o espaço foi tomado por novos ocupantes. Homens armados com cassetetes, passaram a ser vistos onde antes o espaço era nosso. A amizade com Dori continuou por muito tempo. Nunca mais eu soube de Irene. Nem perguntei a ele por ela.

                  Aquele espaço antes gramado, que primeiro foi cercado, depois murado, em seguida pavimentado com concreto, e sobre o concreto, enfim, foi instalado um memorial: uma locomotiva sucateada, que operários mantinham bem conservada, talvez a mesma que antes trafegara livre sobre os trilhos que pisávamos agora. Os mesmos sobre os quais a locomotiva conduzira seus vários vagões neles transportando passageiros, mercadorias, mercadores e toneladas de cacau, os mesmos agora soterrados, inertes e soterrados para sempre, enquanto a locomotiva reluz brilhante e estática como um mausoléu de aço. No trem grapiúna funcionara uma pequena lanchonete. No atual “mausoléu”, como eu soube, fora instalada uma lanchonete para a criançada que, acompanhada por familiares comparecia (e talvez até hoje ainda compareça) durante os fins de semana, para se divertir na estaçãozinha, como passou a ser chamada.  Trepadas nela por todos os lados, as crianças abraçam-na, balançam-se, escorregam por seus metais polidos, e uma ou outra, tomando posição como condutor da maria fumaça, dá ordens e exige que se comportem. Mas elas brincam, não lhe dão atenção enquanto suas companheiras fingem-se maquinistas, foguistas e passageiros.  

 

Bahia, setembro, 2024.

   Estação da Estrada de Ferro de Ilhéus, força da história do cacau


COMENTÁRIO E SUGESTÕES DE FM

(Em 17.10.2024)

 

Boa-tarde, caro Ricardo, romancista e contista.

Como lhe disse, li e muito me agradou a leitura de seu expressivo conto "O Trem Grapiúna", não apenas como um belo salto imaginativo, mas especialmente pele que revela e contém de criatividade literária e de redação ficcional, tendo como eixo temático a saudosa Estrada de Ferro de Ilhéus, que a mão maldita de um cascalhoso general então ministro dos Transportes, da ditadura, Juarez Távora, extinguiu com um árido decreto, em 1965, esquecendo tudo que ela forneceu em favor do desenvolvimento econômico e cultural, da região cacaueira, permitindo inclusive o surgimento de arraiais, vilas e cidades. 

Pois é, seu precioso conto tem sua fabulação justamente na remontagem evocativa de rica vivência juvenil nos arredores da então estação desta gloriosa ferrovia, na cidade de Ilhéus, que em tempos remotos era chamada de Princesinha do Cacau. No núcleo de seu conteúdo construtivo e editorial, seu conto oferece um panorama e um retrato do que foi este grandioso meio de locomoção, em linguagem precisa de contornos de prosa realista e comovedoras, emoldurando um triste quadro de um sonho marcha fatal para a infelicidade, tudo revelado pela pureza juvenil dos personagens.

Como não sou crítico literário, nem possuo conhecimentos teóricos para avaliação de algum peso sobre esta sua bela criação ficcional, dentro de um mapa criativo, pelo qual transitaram grandes nomes da literatura nacional (Jorge Amado, Adonias Filho, Hélio Pólvora e uns poucos mais), fico por aqui, para lhe fazer as anunciadas duas sugestões de momento, embevecido com o que a leitura desse conto de mim se apossou.  Em princípio, deixo a seu pessoal e competente critério a viabilidade do que proponho.

Em primeiro lugar, sugiro que se ofereça este precioso conteúdo à diretoria da Revista da Academia da Letras da Bahia, para integrar o elenco de publicações, constantes da separatriz intitulada FICÇÕES, do seu próximo número 63, já que o 62, de 2024 já se encontra em fins de sua programação. Como vê, é uma sugestão, ficando a decisão de importância e oportunidade totalmente com o seu autor.

A outra é mais uma afoiteza de rastro juvenil. Não sei se o amigo sabe, mas possuo um blog, no qual me aventuro a postar conteúdos, como a recordar os meus tempos de editor do caderno A Tarde Cultural, que também infelizmente já não mais existe, num estado em que a cultura é apenas um amontoado de ilusões levadas pelo vento. Pois bem, a proposta que ouso lhe fazer é ter a honra de incluir esta sua breve peça literária numa dessas minhas audácias, justamente a que resolvi produzir, a partir da novela RENASCER, nos seus inícios, em que demonstrava tomar o cacau e a tragédia que lhe causou a praga da vassoura-de-bruxa. Com todas as suas frustrações e pobre imaginação teatral, a novela foi-se para o beleléu, mas esta minha ousadia editorial e jornalística permanece acessível a quem interessado for.

O que afoitamente pretendo? Justamente, incluir este seu belo conteúdo literário, na parte cuja ilustração é uma antiga foto da estação da estrada de ferro de Ilhéus. Para lhe dar total liberdade de pensar e agir, envio-lhe abaixo o link desta aventura, praticamente em forma de construção editorial. Com isso, retorno aos de infância, adolescência e mocidade, quando muito transitei por esta saudosa ferrovia, desde Uruçuca, Itabuna e Ilhéus, ida e volta. Veja abaixo o citado link.

Muito obrigado.

Receba o meu fraternal abraço grapiúna, com votos de feliz e alegre fim de semana.

Florisvaldo

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                     Maria Fumaça, pintura do baiano Almiro Borges

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