terça-feira, 10 de janeiro de 2023

AMOR DE NICA ROTSCHILD POR THELONIUS MONK

 

Pannonica Rothschild e seu grande amor o pianista de Jazz Thelonious Monk

A mulher que largou tudo por Thelonious Monk

Rachel Cooke 

10 de Junho de 2012

Ouviu Thelonious Monk tocar piano uma vez e abandonou a sua vida, cinco filhos incluídos, para se dedicar ao génio americano do jazz. A baronesa Pannonica de Koenigswarter foi deserdada pela família Rothschild e a sua neta-sobrinha, Hannah Roths-child, conta a sua incrível história

No século XIX, o ramo inglês da poderosa e muito rica família Rothschild construiu a maioria das suas casas de campo no Vale de Aylesbury, razão pela qual me encontro numa manhã de nevoeiro de março em Waddesdon Manor, uma fiel réplica vitoriana de um castelo francês. "Acho que esta casa lhe vai transmitir a ideia de como vivia a família", diz Hannah Rothschild, a minha anfitriã. "As cortinas corridas para proteger a arte, os almofadados e os drapejados a criar um efeito sombrio. Estas eram casas à prova de ruído, o das crianças incluído." Crescer numa casa a abarrotar de criados - em Tring Park, que fica no final da estrada, eram os lacaios que levavam as cerejeiras à mesa para que os convidados tirassem a fruta diretamente da árvore - e submersa numa rotina imutável como o mármore era como viver numa gaiola dourada.

Hannah quer que eu absorva esta atmosfera, asfixiante e introspectiva, porque ela acredita que explica, pelo menos em parte, a extraordinária vida da sua tia Pannonica, também conhecida por Nica, objeto do seu avassalador novo livro, The Baroness (A Baronesa).

Nica, nascida em 1913, cresceu em Tring Park (Tring é agora uma escola; Waddesdon Manor é administrado por um fundo presidido pelo próprio pai de Hannah, Jacob, mas está desde 1957 sob alçada do National Trust). Era ali que Nica deixava correr os dias da sua juventude, enfiada num formal vestido branco enquanto aprendia as artes da costura e do piano: para os seus pais, que não concordavam que as raparigas fossem à escola, correr ou brincar às escondidas eram devaneios proibidos para não estragar a roupa. Uma vida monótona e maçadora mas que Nica, desconhecendo-lhe alternativas, nunca pensou contrariar. Em 1934, a seu devido tempo, ela foi apresentada à sociedade e o seu casamento em 1935 com um bonito diplomata francês, o barão Jules de Koenigswarter, não surpreendeu, apesar de muito distante do par perfeito sonhado pela sua ambiciosa mãe. Ele era controlador, mas ela estava habituada a isso.

Em 1948, contudo, algo mudou. A caminho do aeroporto depois de uma viagem a Nova Iorque, Nica parou para visitar o amigo e pianista de jazz Teddy Wilson, que a pôs a ouvir a gravação de Round Midnight por um então desconhecido pianista, Thelonious Monk. Incrédula e fascinada, ela ouviu a gravação vinte vezes seguidas. Perdeu o avião e nunca mais voltou para casa. Para trás deixava marido e cinco filhos. Instalou-se numa suíte do hotel Stanhope e dedicou-se a descobrir o homem que tinha feito aquela música extraordinária. Obviamente, chegar ao errático Monk levou-lhe tempo. Foi só em 1954 - e teve de viajar até Paris para o encontrar olhos nos olhos. Era o homem com quem ela sonhara? Oh, sim. Ele era "o homem mais bonito que já tinha visto", disse. A partir dali, não haveria hipótese de recuo. E nos 28 anos seguintes, Nica dedicou a sua vida a Thelonious Monk. Aos seus olhos, nada do que ele fizesse poderia estar errado. Era um génio, puro e simples, e tudo fazia - não havia dinheiro que não gastasse, lugar onde não fosse - para lhe facilitar a vida.

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A Hannah, levou-lhe quase o mesmo tempo para escrever sobre Nica. Tinha 11 anos quando ouviu falar pela primeira vez nesta improvável parente, pelo seu avô Victor, outro Rothschild extraordinário (Victor ficou famoso por fazer esqui aquático vestido com um roupão Schiaparelli). "És como a minha irmã", disse enquanto Hannah tentava dominar o blues de 12 compassos. "Adoras jazz, mas não é à força que vais aprender a tocá-lo." Hannah já conhecia as suas outras tias-avós, Liberty e Miriam, mas esta Pannonica permanecia um mistério. Quando inquiriu o pai, ele apenas lhe disse: "Nunca ninguém fala sobre ela." Quando perguntou a Miriam, ela disse: "Ela é a Peggy Guggenheim do jazz" e "ela é ordinária".

Mas os rumores que Hannah ouvia eram assustadores. "Ela é conhecida como a Baronesa do Jazz", "Charlie Parker morreu no seu apartamento", "ela vivia com 306 gatos", "24 canções foram escritas para ela", "perseguiu Miles Davis pela 5.ª Avenida abaixo", "foi para a prisão para que ele não fosse"... Por isso, quando Hannah aterrou pela primeira vez em Nova Iorque, em 1984, decidiu telefonar-lhe. "Quer encontrar-se comigo?", perguntou em tom nervoso. "Espetacular" respondeu-lhe a tia-avó, que tinha então 71 anos. "Aparece no clube da Baixa depois da meia-noite." E informou Hannah que reconheceria o sítio pelo grande Bentley azul-pálido estacionado à porta.

Hannah Rothschild tinha então 22 anos e "não estava à altura das expectativas, reais ou imaginadas, da minha distinta família". Era como se Pannonica, alguém que se regia apenas pelos seus próprios critérios e com sucesso, lhe atirasse uma espécie de salva-vidas. A própria existência de Nica mostrava o quanto alguém pode escapar ao seu passado. "Olhei para o outro lado da mesa, para esta recém-descoberta tia-avó", escreve Hannah no seu livro, "e veio-me um súbito e inexplicável laivo de esperança. Qualquer estranho que entrasse no clube naquele instante veria apenas uma velhota a chupar o seu cigarro, enquanto ouvia o pianista. Poderia interrogar-se sobre o que faria ali aquela mulher enfiada no seu casaco de peles e brincos de pérolas, gingando ao som da música e abanando a cabeça sempre que apreciava um solo. Eu via uma mulher que se sentia em casa e que sabia que era ali que pertencia". A sua tia tinha algum conselho para lhe dar? Apenas isto. "Lembra-te: só existe uma vida", disse.

Hannah regressou a Londres para começar finalmente a trabalhar na BBC ("onde sempre quis trabalhar, mas as cartas de rejeição teriam dado para forrar uma parede", diz). Ela e a tia encontraram-se apenas mais duas vezes; em 1988, Nica morreu subitamente na sequência de umby-pass. Mas, por essa altura, já Hannah estava viciada. Queria saber tudo sobre a vida misteriosa desta tia, destrinçar a realidade da ficção. Enfrentando alguma oposição da família, para quem uma das prioridades, diz, é "o secretismo obsessivo", decidiu-se a investigar a história pelos seus próprios meios. Não foi fácil. As mulheres da família Rothschild recusaram-se a atender os seus telefonemas; e ainda recebeu duas cartas com ameaças. Os filhos de Nica, que num primeiro momento se tinham mostrado entusiasmados com a ideia de um livro, acabaram por nunca cooperar. "Não posso falar por eles, mas talvez tenham sentido que tinham algo para proteger, aquela era a história deles, não a minha. Se pensam que foi uma devassa? Não sei."

No fim, chegou lá. Desde então, Hannah fez um documentário para a rádio sobre a sua tia e um filme - e agora, finalmente, escreveu a sua biografia. Terminou? "Sim", ri-se. "Agora vou fazer uma pausa, prometo. "E resolveu o mistério de Nica e Monk? Eram amantes? Apenas bons amigos? (Monk tinha uma mulher que lhe era devota, Nellie, de quem nunca se separou oficialmente). "Não penso que fosse um amor intenso, fervoroso", diz. "Há a tendência para sexualizar qualquer relação, especialmente aquelas que atravessam classes sociais e raças. Sempre que olhamos para Nica com ele (em fotos ou no filme) vê-se que ela está apaixonada: a maneira como o contempla, a forma como lhe estendeu toda a sua vida aos pés como um manto dourado de devoção. Mas não acredito que o sexo tenha estado no âmago de tudo, porque se assim fosse não duraria tanto. Foram 30 anos a ser testada [por Monk] até ao limite. E isso terá sido difícil. Pensei intensamente no assunto. Não queria retratá-la como uma groupie triste e cheia de dinheiro. Ela usou-o? Ele usou-a? E por que é que Nellie aguentou tudo? É que Nellie nem precisava do cariz sexual para se fartar daquela situação."

Os derradeiros anos de Monk, quando a sua saúde mental o levou a desaparecer de vez da cena jazzística, foram passados na casa infestada de gatos de Nica em New Jersey. Mas no seu funeral - Monk morreu de ataque cardíaco em 1982 - Nellie e Nica sentaram-se lado a lado na primeira fila da igreja e todos apresentaram as suas condolências, a uma e outra, como se ambas fossem viúvas.

Hannah Rothschild cresceu, não num palácio, mas em Maida Vale, na parte ocidental de Londres, numa casa que é agora sua (divorciada, é aí que vive com as três filhas adolescentes). Quando é que percebeu, afinal, que a sua família não era como as outras? "Não creio que alguma vez o tenha percebido. A nossa família é tão-somente a nossa família."

A sua tia-avó Miriam, uma famosa entomologista, vivia numa enorme mansão de campo, Ashton Wold, tão coberta de madressilvas e flor-de-mel - um chamariz para os insetos - que no Verão era quase impossível vislumbrar-se de fora. "Os animais de estimação dela eram uma coruja e uma raposa. O meu avô Victor (também ele um famoso cientista) também tinha uma coruja de estimação que costumava voar por ali a piar. Claro que percebia que eles eram excêntricos, mas isso era tudo quanto sabia. De uma coisa tinha a certeza, contudo, é que eles eram algo assustadores. Eram ambos intelectuais ferrenhos que não suportavam pessoas patetas. Se alguém os aborrecia, essa pessoa ficava logo a saber porque eles lhe diziam diretamente. E se fosse preciso saíam da sala a meio da conversa. [Rothschild] é um apelido de peso para se ter. É sinónimo de banca, judeus e dinheiro. Mas, do meu lado, havia ainda este extra de ser intelectual e academicamente reconhecido. Não me sentia filha de banqueiro [o pai, Jacob, é um bem sucedido homem de negócios, tal como o seu irmão Nat]. Mas também não me sentia à altura daquele outro lado. Claro que há enormes vantagens -enormes - de crescer num mundo assim. Vantagens financeiras, claro, mas também por saber que as pessoas se recordam do nosso nome, abrem-se-nos portas. Não posso ficar aqui sentada a queixar-me e a dizer: pobre de mim. Tive uma sorte incrível."

A ascensão da família parecia imparável até à Segunda Guerra Mundial, a partir da qual a fortuna foi delapidada - qualquer coisa como 3.500 obras de arte foram roubadas pelos nazis e muitas das empresas da família nacionalizadas. "Há sete gerações, vivíamos numa casa com 4,2 metros de comprimento, num gueto em Frankfurt", diz. E não parecia haver escape possível ao gueto até, de uma forma algo irónica, (em 1790) os franceses terem bombardeado, derrubando os muros para que finalmente os judeus ficassem livres."

Foi nesta altura que Mayer Amschel, o patriarca dos Rothschild, tomou a famosa decisão de enviar os seus cinco filhos para cinco capitais europeias onde, entre si, vieram a criar o maior banco do mundo. E destes cinco, foi Nathan Mayer, o tetravô de Nica, quem chegou a Inglaterra em 1798 sem formação académica, sem falar inglês, e quem estava mais empenhado em ter sucesso. No final do século XIX, o ramo britânico da família tinha um título, uma colecção de arte incalculável, muitas propriedades imobiliárias (Hannah mostra-me um quadro que ilustra 40 casas Rothschild) e era ouvido pelo primeiro-ministro.

O pai de Nica foi Charles Rothschild. Tal como o seu irmão zoólogo, Walter, que transformou os terrenos de Tring num extraordinário parque de vida selvagem com cangurus, tartarugas gigantes, emus, rheas, casuares, e que conduzia uma carruagem puxada por zebras, Charles tinha uma paixão por história natural. Era um fervoroso entomologista amador e chamou à sua filha mais nova Pannonica, o nome de um insecto da família das borboletas. Mas este não era um interesse que tivesse liberdade de perseguir. Pelo contrário, todos os dias tinha de vestir o fato e ir trabalhar no banco da família. Não lhe assentava bem.

Charles sofria também de uma doença mental que poderia ou não ser esquizofrenia (tal como, mais tarde, uma das suas filhas, Liberty). Às vezes, ficava dias sem dizer uma palavra. Noutras ocasiões, tornava-se maníaco, incapaz de dormir ou parar de falar. À medida que foi ficando mais velho, os intervalos entre estes episódios foram-se tornando cada vez mais curtos. Finalmente, em 1923, entrou numa casa de banho, trancou a porta e cortou a garganta com uma navalha.

Hannah acredita que o suicídio de Charles está no centro da sua ligação improvável a Monk, que sofria de uma doença semelhante, com sintomas parecidos. "A morte do seu pai foi incrivelmente violenta, mas depois disso nunca mais foi mencionada: o suicídio ainda era ilegal. Quando ela conheceu Thelonious, deve ter sentido ressonâncias enormes. Ele tinha um comportamento muito parecido com o de Charles, e Charles foi obrigado a levar um certo tipo de vida, a ir todos os dias para o escritório, quando o que ele gostava de fazer era colecionar borboletas. As suas tentativas apaixonadas de dignificar a vida de Thelonious, de o proteger, de dizer que não fazia mal ele passar o dia inteiro a dormir se era isso que ele queria ou precisava... Estou certa de que esta era a sua maneira de remendar uma injustiça anterior. Foi uma espécie de compensação. Em troca, ele deu-lhe um objetivo, um incrível sentimento de pertença. Se pensarmos nela como uma mulher que foi expulsa da família, isso é bastante assustador. Mas Thelonious e todo o grupo de músicos disseram-lhe: vem e faz parte disto. Nós ficamos contigo."

Monk não foi o único a escrever uma canção para Pannonica. Também o fizeram Art Blakey, Sonny Clark, Kenny Drew e pelo menos mais uma dezena de outros.

Mas a vida em Nova Iorque também teve um lado negro. Em 1955, Nica foi expulsa da sua suíte no Stanhope quando Charlie Parker, depois de lhe bater à porta uma noite sem ter mais ninguém a quem procurar, entrou em asfixia e morreu ali (ela disse ter ouvido um trovão quando a vida o deixou - um som que desde então faz parte do folclore do jazz).

Em 1958, Nica decidiu levar o empobrecido Monk a um gig em Maryland. Numa terra chamada New Castle, em Delaware, estacionou o carro à porta de um motel para ele ir à casa de banho. Enquanto esperava, a polícia aproximou-se; nesta parte dos Estados Unidos, uma mulher branca e um homem negro juntos era suficientemente invulgar para chamar a atenção. Seguiu-se uma discussão. Monk foi agredido. A polícia fez uma rusga ao carro. Quando encontraram marijuana, Nica sabia exatamente o que tinha que fazer. Monk estava demasiado frágil para ir para a prisão. Ela disse que a droga era dela.

As consequências deste momento de coragem foram desastrosas. Nica incorria numa pena de dez anos de prisão, seguida de deportação imediata. A sua vida com Monk chegaria ao fim, mas a perspectiva de regressar a Inglaterra era-lhe ainda mais penosa. Como é que a sua família iria reagir? Iria o marido deixá-la ver os filhos? "Deve ter sido assustador", diz Hannah. "Descobri finalmente quão assustador numa carta que escreveu à sua amiga Mary Lou Williams na noite anterior ao julgamento, em janeiro de 1962. Está em Delaware. Escreve a dizer que vai a uma igreja acender uma vela. Escreve: "Este é o dia do qual todo o meu futuro dependerá." Diz que não consegue falar com Thelonious ou Nellie sobre isso porque eles têm as suas próprias preocupações. Ela estava totalmente sozinha. Sofri muito por ela. Onde estão todos?, pensei." No final, porém, aconteceu um milagre: o caso foi anulado devido a uma questão técnica, com o advogado a argumentar que os polícias revistaram o carro sem a autorização dela.

Em The Baroness, Hannah conta esta história com cautela, equilibrando a tensão narrativa com um desejo de apresentar todos os factos para que os leitores possam formar as suas opiniões. Tal como o resto do livro, prende-nos totalmente. Será que vai escrever outro livro, ou vai voltar ao seu primeiro amor, o cinema? "Estou a trabalhar num romance. É uma coisa estranha. Tendo sido realizadora de documentários durante quase toda a minha vida adulta, de repente, não tenho a certeza de continuar a sê-lo."

Torna-se cada vez mais difícil encontrar produtoras para o tipo de filmes - detalhados, minuciosos, de digestão lenta - que ela faz. O seu maravilhoso documentário sobre [o político trabalhista] Peter Mandelson, filmado como se fosse uma mosca na sala nas vésperas das eleições de 2010 (aquele em que ele come um iogurte de uma forma que parece uma doninha a comer um rato do campo), não recebeu apoios e só o vendeu à BBC4 depois de terminado. "Foi muito embaraçoso. Ele perguntava "Como vai o nosso filme?" e eu tinha de lhe dizer que não sabia." Voltou a falar com ele desde então? "Ele viu o filme, gostou e foi tudo". Mandelson é amigo do seu irmão Nat (foram famosas as férias de Mandelson na sua casa em Corfu). Mas Hannah não pode falar de Nat. "Ele detesta mesmo que o faça. Adoro o meu irmão. É uma pessoa fantástica. Mas tenho de respeitar isso."

Para os estranhos, a admiração é que ela simplesmente trabalhe. Muitas pessoas com a sua ascendência teriam ido para Oxford, como ela foi, e permitido que o fundo patrimonial desse cabo delas. "Sim", diz ela. "Mas a verdade é que o trabalho é muitíssimo interessante. É aquilo em que nos podemos apoiar realmente e é tão excitante - o meu pai ensinou-me isso. Mas, enquanto escrevia o livro, pensava na ética do trabalho, na forma como persiste na nossa família. Ao contrário das famílias aristocratas britânicas, talvez não nos tenhamos esquecido de onde viemos."

Em relação ao dinheiro, "fiz as minhas pazes com ele... se andasse por aí sem qualquer propósito talvez sentisse de forma diferente, mas a herança permite-nos fazer coisas boas na nossa fundação. Acho que está totalmente correto que as pessoas que têm mais devem dar e tornar melhor a vida dos que não têm. O meu pai está a planear doar o seu dinheiro. Até já começou, e ainda bem para ele".

Descemos para o andar de baixo, para dar uma volta à casa, enquanto gozo o prazer tonto de passar por cordas de veludo e entrar em portas com placas a dizer privado. A casa é linda, mas, como ela salienta, foi um projeto isolado. Os Rothschild não tinham mobília para herdar e estes interiores foram uma cortesia de dois hotéis franceses que estavam a ser demolidos depois da recuperação de Paris feita pelo barão de Haussmann (em finais do século XIX). Gostaria que ainda estivesse na família? "Meu Deus, não", disse com um gesto teatral. "Mas escrever o meu livro fez-me entender estas casas. Eram uma forma de a família se ancorar, de mostrar ao mundo que tinha relevância. Quando pensamos nisso, esta casa é um cartão de visita a três dimensões."

Exclusivo de PÚBLICO (Lisboa-PT)/ The Guardian (Londres)

 https://www.publico.pt/2012/06/10/jornal/a-mulher-que-largou-tudo-por-thelonious-monk-24465110

                    

      Lester Young, um dos maiores do sax-tenor, ao lado de Hawkins e de Ben Webster

  LESTER YOUNG, THE PREZ, DO SAX-TENOR, (1909-1959)

Lester Young foi um dos verdadeiros gigantes do jazz, um saxofonista tenor que inventou uma concepção completamente diferente para tocar a sua buzina, flutuando sobre linhas de bar com um tom claro em vez de adotar a abordagem vigorosa de Coleman Hawkins, então dominante. Um não-conformista, Young (apelidado de "Pres" por Billie Holiday) teve a experiência irónica nos anos 50 de ouvir muitos jovens tenores a tentar soar exatamente como ele.
Apesar de ter passado os seus primeiros dias perto de Nova Orleães, Lester Young viveu em Minneapolis em 1920, tocando numa lendária banda familiar. Estudou violino, trompete e bateria, começando no alto aos 13 anos. Porque ele se recusou a fazer turnê no sul, Young saiu de casa em 1927 e, em vez disso, fez turnê com os Bostonianos de Art Bronson, mudando para tenor. Ele estava de volta com a banda da família em 1929 e depois freelance por alguns anos, tocando com os Blue Devils (1930), Eddie Barefield em 1931, de volta com os Blue Devils durante 1932-1933, e Bennie Moten e King Oliver (ambos 1933). Ele estava com o Count Basie pela primeira vez em 1934, mas saiu para substituir Coleman Hawkins por Fletcher Henderson. Infelizmente, era esperado que Young tentasse imitar Hawk, e seu som descontraído irritou os acompanhantes de Henderson, resultando em Pres não durar muito. Depois de uma turnê com Andy Kirk e alguns breves trabalhos, Lester Young estava de volta com Basie em 1936, mesmo a tempo de estrelar com a banda enquanto eles se dirigiam para o leste. Young fez história durante os seus anos com Basie, não só participando das datas recordes do Count, mas estrelando com Billie Holiday e Teddy Wilson numa série de clássicas sessões de pequenos grupos. Além disso, nas suas raras gravações em clarinete com Basie and the Kansas City Six, Young exibiu um som legal muito original que quase soou como o altoista Paul Desmond nos anos 50. Depois de deixar o Count em 1940, a carreira de Young tornou-se um pouco sem rumo, não capitalizando a sua fama no mundo do jazz. Ele co-liderou uma banda discreta com o seu irmão, o baterista Lee Young, em Los Angeles até voltar a juntar-se ao Basie em dezembro de 1943. Young teve nove meses felizes com a banda, gravou uma sessão memorável de quarteto com o baixista Slam Stewart, e estrelou o curta-metragem Jammin' the Blues antes de ser recrutado. As suas experiências ao lidar com o racismo no exército foram horríveis, afetando o seu estado mental de espírito para o resto da sua vida.

Os Giants do Jazz '56

Apesar de muitos críticos terem escrito que Lester Young nunca soou tão bem depois de sair do exército, apesar de uma saúde errática, ele realmente estava no seu auge em meados dos anos 40. Ele fez uma turnê (e foi bem pago por Norman Granz) com Jazz na Filarmónica durante os anos 40 e 50, fez uma série maravilhosa de gravações para Aladdin, e trabalhou constantemente como single. Young também adotou o seu estilo bem para o bebop (que ele ajudou a preparar o caminho nos anos 30). Mas mentalmente ele estava sofrendo, construindo um muro entre ele e o mundo exterior, e inventando seu próprio vocabulário colorido. Embora muitas das suas gravações na década de 1950 fossem excelentes (mostrando uma profundidade emocional maior do que nos seus dias anteriores), Young estava incomodado com o fato de que alguns dos seus imitadores brancos estavam ganhando muito mais dinheiro do que ele. Bebeu grandes quantidades de álcool e quase parou de comer, com resultados previsíveis. O álbum Jazz Giants de 1956 encontrou-o no auge, assim como um noivado bem documentado em Washington, D.C., com um quarteto e uma última reunião com Count Basie no Newport Jazz Festival de 1957. Mas, para a transmissão de 1957 The Sound of Jazz, Young tocou principalmente sentado (embora ele tenha roubado o show com um solo emocional de blues tocado para Billie Holiday). Depois de ficar doente em Paris no início de 1959, Lester Young chegou a casa e, essencialmente, bebeu até à morte. Muitas décadas após a sua morte, Pres ainda é considerado (juntamente com Coleman Hawkins e John Coltrane) um dos três mais importantes saxofonistas tenores de todos os tempos.
Fonte: Scott Yanow

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